Bom na escola, na vida?

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Escola emocional

Nota do Instituto Alfa e Beto:
Este artigo foi publicado originalmente no site Brasil Post

Sim e não. Há muito acordo sobre o que significa ser “bom na escola”, menos acordo sobre o que significa ser “bom na vida”. Dar-se bem não é necessariamente ser bom. Mas muitos hão de concordar que bom na vida inclui a capacidade de se tornar adulto, relacionar-se de forma saudável com seus semelhantes e ser capaz de ganhar a vida com o próprio esforço. Em palavras mais palatáveis, ser capaz de contribuir produtivamente para a sociedade.

Há pelo menos três aspectos em comum entre dar certo na escola e dar certo na vida. Todos três têm a ver com o processo do desenvolvimento humano.

Primeiro, é preciso amadurecer, ter autocontrole, dominar os impulsos. Isso faz bem para o indivíduo, para suas relações com os outros e para sua capacidade de aprender. O teste do marshmallow é incontestável: as crianças que preferem esperar 10 minutos para ganhar 2 marshmallows ao invés de ganhar um imediatamente terão menos problemas para enfrentar a vida adulta. Quem conta até 10 antes de morder o coleguinha terá menos probabilidade de se envolver em confusões. Quem pensa antes de pegar no lápis ou no teclado faz uma redação melhor.

Segundo, conviver com os semelhantes. O provocante título de um livro de Robert Fulghum, “Tudo que eu preciso na vida aprendi no jardim de infância”, expressa bem o papel da educação e da escola, desde os primeiros anos. Dentre essas coisas importantes que aprendemos desde cedo inclui-se a capacidade de conviver com outros — preservando a própria identidade. Conviver, relacionar, trabalhar-se em grupos não é sinônimo de ser boi de manada, vaca de presépio ou de participar de qualquer gangue para não se sentir excluído. O estudioso da evolução David Wilson mostra que não somos apenas animais individualistas — a cooperação em grupos permite atingir benefícios que um indivíduo sozinho nunca poderia conseguir.

Terceiro, esforço vale mais do que inteligência. A capacidade de lidar com questões de forma abstrata facilita aprender. Mas também pode atrapalhar. Quando atribuímos o sucesso da criança ou jovem à sua inteligência, a tendência é que ele procure situações fáceis para brilhar, e evite as difíceis. Com isso se torna menos esforçado. Já as pessoas que são elogiadas pelo esforço empenham-se mais, arriscam-se mais e assim, aumentam as chances de acertar e lidar com desafios mais complexos. Os pífios resultados da elite brasileira nos testes do Pisa são um eloquente atestado à crescente mediocridade intelectual de nossos jovens — nutrida pela falta de desafio dos que estão condenados ao ensino público.

Esses três exemplos mostram a relação entre habilidades cognitivas e não cognitivas, entre o acadêmico e o comportamento. O ser humano é um só. “O Visconde partido ao meio”, de Ítalo Calvino, não somente é uma divertida obra-prima, mas ilustra bem os infortúnios de quem desenvolve apenas em um dos lados.

As implicações práticas para pais e educadores são óbvias: educação não é moleza e não é para dar moleza. O processo educacional — em casa e na escola — é um processo. A forma de ser e de fazer é tão importante quanto o que se faz. E nesse processo, cujos contornos são claros, mas em que não há receitas, o exemplo vale mais do que mil palavras.