Alunos com melhor fluência de leitura também compreendem melhor o que leem

É o que aponta estudo sobre a relação entre fluência e compreensão de leitura: evidências para falantes do português-brasileiro. Resultados indicam que a promoção da fluência de leitura na sala de aula é fundamental para que os alunos desenvolvam boa compreensão de leitura. Confira detalhes do artigo e entrevista com autores a seguir

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Alunos com melhor fluência de leitura também compreendem melhor o que leem

A compreensão de leitura é crucial para navegarmos na sociedade contemporânea. Porém, as escolas brasileiras têm falhado na promoção da compreensão de leitura de seus alunos. Segundo dados do IBGE, cerca de 38 milhões de brasileiros não compreendem o que leem— são considerados analfabetos funcionais. Por isso, é crucial a identificação de fatores que podem ser usados para desenvolvimento da compreensão de leitura.

Por muito tempo, a ciência cognitiva da leitura indicou que a compreensão de leitura era um produto entre decodificação e habilidades linguísticas. Todavia, estudos internacionais mais recentes indicam que a fluência de leitura é a ponte que liga a decodificação e a compreensão. A fluência de leitura consiste em ler rapidamente, sem erros e com prosódia adequada. Quando o aluno tem leitura fluente, ele pode direcionar seus recursos mentais para a compreensão de leitura.

Em um estudo aceito para publicação na revista científica “Cadernos de Linguística”, a equipe de pesquisadores do IAB demonstrou que a fluência de leitura também é importante para compreensão de leitura no Português. Alunos do 2º, 3º e 4º anos que leem mais palavras em um minuto e com maior quantidade de acertos também apresentam maior pontuação em uma tarefa de compreensão e sentenças. Ou seja, quem lê com fluência compreende o que lê.

Esses resultados indicam que a promoção da fluência de leitura na sala de aula é fundamental para que os alunos desenvolvam boa compreensão de leitura. Espera-se que os alunos proficientes em leitura leiam entre 60 e 80 palavras por minuto, com menos de 5% de erros, ao final do 1º ano. Por isso, a fluência de leitura deve ser um dos focos do currículo de alfabetização.

O artigo foi aceito para publicação e estará disponível em breve no site da revista “Cadernos de Linguística”, da Associação Brasileira de Linguística.

Confira abaixo uma entrevista com o professor João Batista Oliveira e a pesquisadora Isabella Starling, Psicólogos e PhDs em Educação, autores do estudo:

  1. O que é fluência de leitura? E o que é compreensão de leitura?

João Batista Oliveira:  Fluência de leitura se refere à qualidade da leitura. Essa qualidade se mede por meio de 3 dimensões: a quantidade de palavras lidas, a quantidade de erros e a qualidade da leitura, ou seja, a prosódia. A compreensão refere-se à capacidade de extrair o sentido do texto. Podemos compreender a partir da linguagem oral, pela leitura feita por outra pessoa ou pela leitura feita por nós mesmos. Uma criança pode compreender sem saber ler. Mas para compreender o que se lê é fundamental desenvolver a capacidade de fluência. Há um limite mínimo de fluência abaixo do qual não somos capazes de compreender – leitura muito lenta, com muitos erros, sem ritmo.

  1. O que motivou a condução deste estudo?

Isabella: Diversos estudos internacionais, feitos por exemplo com falantes do inglês, italiano e espanhol, demonstram que melhor fluência de leitura está associada a melhor compreensão de leitura. Porém, era preciso também investigar se essa relação acontece no Português Brasileiro. Alguns estudos prévios mostravam que sim. Porém, eles apresentavam algumas limitações. Por exemplo, os estudos contavam com um número pequeno de participantes, o que pode gerar resultados enviesados. Além disso, estudos feitos com alunos de séries mais avançadas, após o ciclo de alfabetização, mostravam resultados inconsistentes: alguns encontravam associação entre fluência e compreensão de leitura e outros não. Contribuímos com esses estudos ao investigar a associação entre fluência e compreensão de leitura com amostras mais robustas, compostas por alunos do 2º, 3º e 4º anos.

  1. Como o estudo foi feito?

Isabella: Nesse estudo, investigamos a associação entre fluência e compreensão de leitura. Compuseram a amostra 147 alunos do 2º ano, 160 alunos do 3º ano e 197 alunos do 4º ano. No final de 2021, os alunos completaram uma medida de fluência de leitura e uma medida de compreensão de leitura. No Teste de Fluência de Leitura, desenvolvido pelo IAB, os alunos leram um texto apropriado para sua série por um minuto. Foram computadas quantas palavras os alunos leram no tempo limite, e quantos acertos e erros cometeram. A medida de compreensão de leitura foi o TELCS, um teste desenvolvido pela equipe de pesquisa liderada pela Dra. Ângela Pinheiro. Neste teste, os alunos tiveram um tempo limite de 5 minutos para completar, sem ajuda, o máximo de frases incompletas que conseguissem. O TELCS tem 36 frases incompletas e é de múltipla-escolha. Investigamos a correlação entre as medidas de fluência e compreensão de leitura para cada série.

  1. Qual o principal resultado encontrado?

Isabella: Os resultados mostraram que alunos que leem mais palavras por minuto, com maior acurácia, também têm melhor pontuação na tarefa de compreensão de leitura. Este resultado foi verdadeiro para alunos do 2º, 3º e 4º anos. As associações encontradas foram de moderadas a forte, o que indica que a fluência de leitura explica uma parte importante da habilidade de compreensão de leitura.

  1. Quais os próximos passos do IAB na investigação da associação entre fluência e compreensão de leitura?

Isabella: No estudo realizado, mostramos que há associação entre fluência e compreensão de leitura medidas no mesmo ano. Porém, é importante investigar como essa associação ocorre ao longo dos anos. Estamos finalizando um novo estudo que investiga como a fluência de leitura medida no 2º ano contribui para a compreensão de leitura medida no 5º ano.

  1. Por que o estudo foi publicado na revista “Cadernos de Linguística” da Abralin?

João Batista Oliveira: Nosso objetivo é duplo. Primeiro, estar presentes numa revista de boa qualidade acadêmica e que tem presença importante entre os estudiosos de Língua Portuguesa.  Segundo, para atrair a comunidade de estudiosos da língua para um tema tão importante como este – mas que deixou de fazer parte da tradição pedagógica do Brasil – pelo menos nos últimos sessenta anos.  A psicolinguística é uma área de confluência entre a linguística e a psicologia da aprendizagem: na psicolinguística estudamos os processos psicológicos associados ao processo de aquisição da linguagem e do processamento linguístico.  A fluência de leitura – ao lado da alfabetização – é um importante capítulo dessa disciplina.

  1. Quais as implicações práticas deste estudo?

João Batista Oliveira: Esse estudo é original no sentido de confirmar achados já realizados em outros países para os falantes da Língua Portuguesa. Essa confirmação serve para demonstrar que os conhecimentos científicos sobre o tema realizados em outros países também são relevantes para o nosso país, pois aqui também encontramos o mesmo tipo de associação entre a fluência e a compreensão.  Como toda pesquisa, trata-se de mais uma gota d’água num oceano de informações que apontam, com clareza cada vez maior, para a importância do desenvolvimento sistemática da fluência de leitura.

  1. Como o IAB pode auxiliar no desenvolvimento da fluência e compreensão de leitura?

João Batista Oliveira: O Instituto Alfa e Beto possui diversos programas e instrumentos para desenvolver fluência de leitura. Somos o único programa de alfabetização disponível no país que possui instrumentos específicos para desenvolver a fluência de leitura durante o processo de alfabetização. E também desenvolvemos materiais e instrumentos para desenvolver fluência de leitura em todas as séries do ensino fundamental.

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