Repensando a educação brasileira – o que fazer para transformar nossas escolas

1499
Escola emocional

Nota do Instituto Alfa e Beto:
Este artigo foi publicado originalmente no site Congresso em Foco

O título, que corresponde ao do livro que acabo de publicar, reflete bem a proposta: é preciso repensar a educação brasileira, a partir de novos critérios.  O Brasil poderia avançar muito se, ao invés de perder-se em infindáveis discussões ideológicas, adotasse como critério para o debate as evidências científicas sobre o que funciona em educação e as melhores práticas adotadas pelos países de maior êxito.  Foi assim que a maioria dos países desenvolvidos veio implementando suas reformas educativas nas últimas décadas.

Por que é preciso repensar a educação? A primeira resposta é objeto de consenso nacional: a escola pública brasileira não funciona e a escola particular não é lá essas coisas. As notas no PISA e nos testes nacionais não deixam dúvida quanto a isso.

Mas o livro aprofunda o diagnóstico: ele analisa as causas dos problemas. Essas se dividem em três grandes grupos. A primeira causa dos problemas é a questão cultural. A escola sempre serviu para transmitir o patrimônio cultural acumulado pela humanidade. No mundo pós-moderno a ideia de cultura vem sendo colocada em xeque, e tornando-se mais objeto de consumo do que um patrimônio, algo valioso e feito para durar.  A ideia da escola também foi colocada em xeque – de um lado trazendo para ela milhares de problemas que ela não consegue resolver, de outro retirando dela a sua função principal, que é transmitir os conhecimentos acumulados pelo patrimônio cultural da humanidade. Com isso a escola e os professores perdem sua autoridade. Sem um consenso mínimo a respeito do que seja a escola e o que se espera dela dificilmente poderemos avançar.  Em todos os países em que a educação funciona, mesmo no mundo pós-moderno, a função primordial da escola é a de transmitir conhecimentos considerados fundamentais, estruturadas em disciplinas, e de uma forma que permita ao indivíduo avançar esse conhecimento por meio do exercício da razão. É daí que deriva o papel da escola e a autoridade do professor.  Sem isso é difícil avançar.

A segunda causa refere-se à falta de pressão social: a população brasileira está satisfeita com a educação.  A escola oferecida aos filhos da maioria da população é muito melhor da escola que eles tiveram, ou a que abandonaram.  Mesmo que os resultados sejam pífios, esse fato é inegável. Já a classe média e as elites se contentam em alcançar um diferencial apenas um pouquinho melhor do que a massa – isso é o suficiente para garantir seus privilégios. Portanto, não há pressão social para melhorar. E sem isso é difícil que os governos se mobilizem.

O terceiro conjunto de causas relaciona-se com o jeito brasileiro de governar: o modelo de expansão sem qualidade, os desarranjos do federalismo, a ineficiência causada pelos mecanismos de financiamento, a força do corporativismo e do clientelismo e, sobretudo, a falta de um conjunto de instituições que constituem o cerne de qualquer projeto educativo.

Para além do diagnóstico, e com base nos critérios de evidências e melhores práticas, o livro propõe um conjunto de mecanismos ou instituições que deveriam se constituir como pilares de um projeto nacional de educação. Entre eles se inserem questões como a de uma política para atrair e formar docentes e gestores, currículos adequados, políticas integradas para a primeira infância, diversificação do ensino médio, avaliação, formas adequadas de financiamento e de articulação entre os níveis da federação. Não se trata de criar programas ou projetos efêmeros – trata-se de estimular o desenvolvimento de instituições, a partir de valores compartilhados e de mecanismos institucionais que assegurem a vitalidade permanente de políticas e práticas educativas.  Nesse campo, o Brasil possui pouco consenso e pouquíssimas instituições. É território a ser desbravado.

O sucesso de qualquer reforma educativa se mede pela sua capacidade de alterar o que acontece dentro da sala de aula. E esta também é a grande dificuldade de qualquer reforma – chegar ao destino.  Mesmo reconhecendo os desafios e entraves para o sucesso de qualquer reforma, o livro aponta alguns caminhos que – com base em instituições sólidas – poderiam contribuir para iniciar um processo de melhoria da qualidade da educação no Brasil.  Entre esses incluem-se sugestões para repensar a questão do magistério, políticas adequadas para cada nível de ensino, formas inovadoras de financiamento e de estímulo à inovação e novos papéis para os diferentes níveis de governo.

Esta é a proposta deste livro. Sem qualquer ambição de oferecer “a solução”, propomos um debate a respeito das escolas que temos, dos fundamentos de um projeto educacional apoiado num conceito minimamente adequado de Escola e nas possibilidades e limites que temos para repensar essa instituição.

Nossas crianças e jovens não estão aprendendo como deveriam e poderiam, estão sendo privados de participar dos benefícios e oportunidades oferecidas aqui e fora de nosso país, mas, sobretudo, estão sendo privados de uma educação que lhes permita fazer melhor do que fez a nossa geração. É nossa responsabilidade ajudar a encontrar e corrigir os rumos. Por isso, este livro serve também de alerta, convite e convocação ao debate.