Nota do Instituto Alfa e Beto:
Este artigo foi publicado orignalmente no site de Simon Schwartzman
No Brasil adoramos os milagres, que permitem resolver grandes problemas sem precisar passar pelos processos difíceis de organização, planejamento, estudo, trabalho e investimento. Se nossa educação anda tão mal (apesar das grandes comemorações de pequenas melhorias que surgiram em algumas avaliações recentes), quem sabe que as novas tecnologias de informação e comunicação nos permitirão sair na frente? Com apoio do BNDES, o Governo Federal lançou no ano passado o Programa Um Computador por Aluno – PROUCA.
Várias Secretarias de Educação, entre as quais a do Rio de Janeiro, estão aderindo: no final de dezembro de 2010 foi assinado um convenio pelo qual, na cidade do Rio, “todos os 246 mil alunos do segundo segmento (6° ao 9° anos), de 397 escolas, terão computadores nas salas de aula.” Ótimo, não é? Infelizmente, quase todos os estudos sobre o uso de computadores em escolas mostram que eles não fazem diferença nos resultados da educação, e podem até ser prejudiciais. Por exemplo, um estudo do Banco Mundial feito na Colômbia mostrou que “estudantes em escolas que receberam computadores e professores para seu uso não se deram melhor em testes do que estudantes em grupos de controle. Os pesquisadores não encontraram nenhuma diferença nos resultados dos testes quando olharam componentes específicos em matemática e linguagem, como álgebra, geometria, gramática e uso de paráfrases em espanhol”.
Várias explicações foram apresentadas para isto, uma delas sendo que os professores não usavam muito os computadores, ou os usavam para ensinar como usar o computador, e não para ensinar os conteúdos das disciplinas. Recentemente, circulou na Internet um artigo de Clayton M. Christensen, especialista em temas de inovação da Harvard Business School, baseado em um livro seu de 2008, ‘Disrupting Class’, cujo resumo e critica pode ser visto por exemplo aqui. Basicamente, o que ele diz é que os computadores realmente não servem para o ensino convencional, mas podem ter um efeito importante se forem utilizados de forma não convencional, para que cada estudante possa encontrar seu próprio caminho. Não por acaso, estas ideias foram retomadas e defendidas em um artigo recente de Rafael Parente, que é Subsecretário de Educação da Cidade do Rio de Janeiro (“Aula de Ruptura”).
Uma das teses principais de Christensen, apresentada por Parente, é que “a chave para a transformação da sala de aula com tecnologia é como ela será implementada. Precisamos começar a inovação através de uma ruptura, não para competir com paradigmas existentes e servir clientes atuais, mas para conquistar aqueles que não estão sendo servidos, chamados de não-consumidores. Dessa maneira, tudo o que uma nova abordagem tem de fazer é ser melhor do que a alternativa, que não existe.” Fica a pergunta de se é isto que o Ministério da Educação e as Secretarias municipais e estaduais que estão comprando todos estes computadores pretendem fazer.
Será que a ideia é acabar de vez com o ensino regular, com conteúdos bem definidos, professores bem capacitados e alunos incentivados a trabalhar, que ainda não conseguimos implantar, e partir logo para um novo ensino revolucionário e individualizado, segundo um modelo tirado das teorias de inovação das escolas de business, que não sabemos exatamente como deve ser? Transferindo as ideias de Christensen para o Brasil, quem seriam os “não consumidores” que não estão sendo servidos pela educação? Os que abandonaram as escolas ou os que estão matriculados hoje, mas recebendo educação de má qualidade?
O ponto principal, que nenhuma tecnologia vai resolver, é que não se faz boa educação sem bons professores, escolas organizadas e estudantes estimulados e incentivados a trabalhar. Com estes ingredientes, então as novas tecnologias podem ajudar muito. Sem eles, elas servem muito pouco. Seria importante ter clareza sobre estas coisas antes de embarcarmos tão confiantes nas maravilhas das novas tecnologias (que, aliás, com os tablets, tornarão todos estes milhares de computadores obsoletos em muito pouco tempo).