Professor João Batista Oliveira fala sobre os desafios no retorno das aulas presenciais durante o Seminário de Abertura do Ano Letivo 2022 em Sobral (CE)

Instituto Alfa e Beto é homenageado pelo Secretário de Educação de Sobral, Herbert Lima, pelo trabalho que vem realizando desde 2003 pela educação do município cearense, referência nacional em qualidade de rede pública de ensino

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Professor João Batista Oliveira fala sobre os desafios no retorno das aulas presenciais durante o Seminário de Abertura do Ano Letivo 2022 em Sobral (CE)

O professor João Batista Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto, foi convidado pela Secretaria Municipal de Educação de Sobral (CE) a participar do Seminário de Abertura do Ano Letivo 2022, que aconteceu entre os dias 26 e 28 de janeiro. Desde 2003, o Instituto Alfa e Beto é parceiro da Secretaria Municipal de Educação de Sobral, cidade que é referência nacional de excelência em rede pública de ensino.

Ao cumprimentar o professor João Batista Oliveira, o Secretário de Educação de Sobral, Herbert Lima, prestou uma homenagem ao Instituto Alfa e Beto: “É uma grande honra e alegria contar com a presença do professor João Batista Oliveira na abertura deste Seminário. Aproveito para agradecer em público pelo trabalho que o Instituto Alfa e Beto tem feito pela educação do município de Sobral. São contribuições bastante importantes, seja na disponibilização de materiais didáticos de qualidade, no desenvolvimento de estudos e pesquisas, na promoção da formação continuada dos nossos técnicos e educadores. O município de Sobral tem um imenso respeito e uma enorme gratidão ao professor João Batista Oliveira, e eu aproveito essa oportunidade para homenagear o Instituto que ele preside na abertura do ano letivo de 2022”, disse.

A fala do professor João Batista Oliveira foi dividida em duas partes. Na primeira, ressaltou a importância de prestar atenção e lidar de forma adequada com os fatores emocionais que foram particularmente afetados pela pandemia e que são fundamentais para o processo escolar, como atenção, memória, concentração e autocontrole. Na parte principal de sua fala, o professor chamou a atenção dos municípios para quatro conceitos pedagógicos básicos: perda de aprendizagem, atraso escolar, falta de base e recuperação. Explicou a diferença entre eles e ressaltou a importância de articular um diagnóstico correto com estratégias eficazes de intervenção.

Seguem os principais trechos da apresentação do presidente do Instituto Alfa e Beto no Seminário de Abertura do Ano Letivo 2022 em Sobral:

Alegria de estar mais uma vez presente em um evento importante de Sobral

“Tenho a dupla alegria de estar aqui hoje. Primeiro, porque estamos falando da volta às aulas. Como educadores, é o que mais podemos esperar. E, segundo, porque estamos em casa, em Sobral, falando com pessoas com que convivemos por mais de 20 anos. Sobral mostra como se faz educação de qualidade. Na verdade, a alegria é tripla, porque também vou apresentar o professor Marcio da Costa, que será um dos palestrantes dessa tarde, e que, em breve, vai coordenar os programas do Instituto Alfa e Beto nos municípios parceiros. O tema sobre o qual vou falar brevemente é a volta às aulas. É um tema da mais alta importância. Primeiro, porque as escolas não deveriam ter ficado fechadas durante todo esse tempo. É um horror o que aconteceu. Em poucos países no mundo, as escolas ficaram tanto tempo fechadas. No mundo inteiro, o resultado desse fechamento nos sistemas públicos de ensino mostra que as melhores tentativas de ensino remoto deixaram a desejar. Em qualquer país, as crianças mais vulneráveis são as que tiveram mais prejuízos – alguns deles para o resto da vida. Além de breve, minha fala será, como sempre, baseada em evidências. Evidências de diversos países. Há muitas publicações recentes sobre o tema, alguns diagnósticos que nós mesmos fizemos e um estudo particular feito no estado de São Paulo”.

Problemas fundamentais nesse momento de retomada das aulas presenciais

“Existem dois níveis de problemas fundamentais que os professores, coordenadores pedagógicos, diretores e secretários municipais de educação devem olhar com mais atenção nesse momento. O primeiro são os aspectos não-cognitivos: ansiedade, depressão, atenção, memória e sociabilidade. Como meu tempo aqui é curto, não vou abordá-los. Mas se trata de aspectos fundamentais nesse momento em que muitas pessoas perderam os seus hábitos, rotinas e procedimentos. Há crianças que não desenvolveram muito bem as habilidades de controle executivo. Tudo isso é um ponto de atenção fundamental. Apenas para concluir esse capítulo dos aspectos cognitivos: a maioria das pessoas, em situações como a que vivemos, se adapta. As feridas ficam, mas a vida volta ao normal. Então, com o tempo, as coisas voltam ao lugar. Agora, há pessoas com sintomas graves como falta de atenção, ansiedade e depressão que precisam de um encaminhamento especializado. Certamente Sobral tem psicólogos competentes que podem ajudar nesse caso. A segunda observação, do ponto de vista prático e pedagógico, é que, nesse momento em que passamos muito tempo sem o hábito da aula diária, da aula normal, presencial, precisamos pensar em aulas com mais quebras, mais intervalos, pequenos períodos de relaxamento e respiração. Deveres de casa mais habituais e pontuais, que ajudem a formar o importante hábito de autonomia e de estudo sozinho e de estudo com a participação da família, que foi e tem sido muito importante durante a pandemia. Precisamos também fazer um uso inteligente dos espaços da escola. Durante o recreio, promover brincadeiras e interações. Estimular a participação dos alunos e a retomada dos laços afetivos em um ambiente mais relaxado. Tudo isso deve ser objeto de nossa atenção”.

Perda de aprendizagem? Atraso, base, aceleração, recuperação e tutoria de ensino

“No que diz respeito ao aspecto cognitivo, vamos falar basicamente de alguns conceitos de maneira prática: perda de aprendizagem (se é que houve), atraso, base, aceleração, recuperação e tutoria de ensino. Perda: o que a literatura mostra sobre isso? É pouco provável que haja perda. Nossa experiência de vida comprova isso. Quando saímos da escola para a vida, não vamos esquecendo as coisas. Pelo contrário. Vamos acumulando e aprendendo mais. Essa é a função da escola. Óbvio que esquecemos alguns detalhes, como fórmulas, equação, calcular o seno e o cosseno. Mas, de um modo geral, aquilo que a gente aprende serve para ir para frente. Esse conceito de perda deve ser bem entendido para evitar pensar que o aluno perdeu aquilo que tinha conquistado. Não é bem assim. Não é o que diz nossa experiência de vida, não é o que diz a evidência. Agora, há grupos em particular que merecem atenção nesse aspecto. Obviamente, quem não teve os dois anos de pré-escola de forma presencial – e se essa pré-escola era boa, como é o caso de Sobral – deve ter perdido no sentido de que não teve. As crianças que não se alfabetizaram terão tido uma perda de oportunidade. Já as crianças que não foram bem alfabetizadas em 2019 também terão problemas, mas certamente esse não terá sido o caso de Sobral, porque as crianças do município geralmente são bem alfabetizadas”.

João Batista Oliveira explica como recuperar as perdas de aprendizagem causadas pela pandemia

O conceito de atraso e a importância de um bom diagnóstico

“Então, o primeiro alerta é esse: cuidado com o conceito de perda. Não é esse o conceito que deve chamar nossa atenção. O conceito importante é o conceito de atraso. Esse é grave. Ele já era grande em muitos lugares do país e precisa ser diagnosticado para ser entendido em toda a sua extensão. A partir desse diagnóstico – e há várias maneiras de fazê-lo -, é necessário decidir se o problema é de base ou de recuperação. Há alguns exemplos que podem ajudar nesse entendimento. Quem não se alfabetizou não tem base. Não tem a base mais fundamental e elementar. Neste caso, não há outra coisa a fazer que não seja alfabetizar. Isso tem um tempo, um ritmo, uma sequência. Quem foi mal alfabetizado não tem remendo. Base é base. Não tem como garibar. Tem que alfabetizar direito. Começar a partir daí. Mas, mesmo quem já foi alfabetizado e está no terceiro, quarto ou quinto ano, ou mesmo nas séries finais, terá tido problemas de base. O aluno que está matriculado agora no quinto ano e que perdeu grande parte das aulas presenciais nesses últimos dois anos possivelmente vai estar, em termos de base, no segundo ou terceiro ano. E é a partir dessa base que é preciso recomeçar. Há as questões práticas. Princípios básicos para orientar nossa reflexão. Feito um diagnóstico adequado, a decisão prática deve ser como enturmar. Vamos enturmar os alunos de acordo com o conhecimento real? De acordo com a série formal em que eles estão? Dificilmente, algum município terá condição de agrupar de forma muito diferente, de colocar todo mundo no nível que deveria estar”.

Perda de aprendizagem ou atraso escolar?

Não dá para recuperar o que não existe, é melhor prover uma base

“O ideal é começar por onde a maioria da turma está. Por isso, é essencial o entendimento dos conceitos de base, aceleração, recuperação. Não dá para recuperar o que não existe. É melhor fazer direito, sem correria. O que estou chamando atenção é que, independentemente da questão formal, de os alunos estarem no quarto, quinto ou sexto ano, é necessário prover uma base, no ritmo adequado, para que os alunos, para que a maioria da turma, cheguem à série normal. O município que conseguir fazer isso em dois anos e chegar aonde deveria estar terá sido um grande sucesso nacional e internacional. O que a evidência mostra no caso dos alunos com problemas específicos? Para esses alunos, uma tutoria intensiva de qualidade é algo que pode fazer muito bem. Além da classe normal, uma tutoria de alta qualidade, intensiva, com cinco a sete alunos, no contraturno, para poder recuperar os conhecimentos mais básicos”.

A questão da fluência de leitura

“É muito provável que não tenha havido perdas de fluência de leitura, porque a fluência de leitura, sobretudo nas séries iniciais, é muito influenciada também pela maturidade. Essas crianças ficaram mais maduras, desenvolveram vocabulário e linguagem. Eventualmente, é claro, muitas delas também leram. No entanto, a fluência é muito importante para a leitura. Como houve dois anos aí atípicos, é importante, sobretudo nas séries iniciais e eventualmente até no sexto ano, cuidar de tarefas e práticas de fluência de leitura, porque isso vai ajudar muito no desenvolvimento da compreensão, inclusive dos materiais didáticos das demais disciplinas”.

Instituto Alfa e Beto lança e-book gratuito sobre “Fluência de Leitura” direcionado para pais e professores

Para poder correr, é preciso começar devagar

“Quem conseguir ajustar tudo em um ano e meio ou dois anos, e colocar os alunos no nível em que eles devem estar, terá feito um ótimo trabalho. A partir, então, dessa retomada, que, inclusive, é uma retomada de hábitos, de rotinas, acelerar aos poucos. Mas não começar acelerando, senão a coisa não vai dar certo. Para poder correr, é preciso começar devagar. Preparar o corpo, fazer o preparo físico dos alunos e dos professores, adquirir ritmo, e depois, lá na frente, depois dessa base bem reconquistada e sedimentada, poder acelerar”.

Lançamento do e-book “Reabrindo as escolas em 2022: Desafios para o gestor escolar”

“Na primeira semana de fevereiro, vamos lançar um e-book chamado Reabrindo as escolas em 2022: Desafios para o gestor escolar. Nele, comento com muito mais detalhes cada um desses tópicos. Concluindo, espero que vocês façam um bom diagnóstico. Existem vários instrumentos para isso. O Instituto Alfa e Beto tem o seu, outros também têm. Decidam pelas estratégias e materiais adequados, criem um clima de proximidade com a família, com os alunos e com os professores para essa retomada. Sobretudo, estejam preparados para não deixar as escolas fecharem novamente. O mundo inteiro fez isso com os cuidados devidos. Não há razão para fechar as escolas. É muita punição para as crianças”.

Saiba mais sobre a parceria entre o Instituto Alfa e Beto e Sobral nos links a seguir:

Encontro em Sobral (CE) alinha ações do Programa Alfa e Beto de Alfabetização, adotado no município desde 2003

Secretaria de Educação de Sobral apresenta sua experiência bem-sucedida na área de alfabetização em evento da Abralin

Livros, aplicativos e ferramentas de comunicação on-line: como Sobral (CE) está mantendo o aprendizado dos seus alunos e o vínculo com as famílias durante a pandemia de covid-19

Em live no canal do YouTube da Secretaria de Educação de Sobral, João Batista Oliveira explica como desenvolver as principais habilidades relacionadas à alfabetização